O Direito Imobiliário leva para a justiça uma série de demandas judiciais que dependem de perícia, seja ao longo do processo ou de forma antecipada. São ações referentes a Revisional de Aluguel, Renovatória de Contrato de Locação, Indenização por Vícios de Construção, Prestação de Contas, Interdito Proibitório, Usucapião, Revisão de Quota de Condomínio Baseada em Fração Ideal, Direito de Vizinhança, Demolitória, Nunciação de Obra Nova, Reparação de Danos, entre tantas outras.
São vários os conflitos que demandam a judicialização, que exigem uma diversidade de especialistas para realizar perícias em processos que discutam cada um desses inúmeros aspectos do Direito Imobiliário.
Uma vez ajuizada uma ação e determinada uma perícia, o juiz nomeará o perito e as partes deverão formular seus quesitos e indicar seu assistente técnico. Cada vez menos os peritos serão nomeados pela livre escolha do juiz, sendo certo que muitos Tribunais Estaduais já atenderam à exigência trazida pelo Novo Código de Processo Civil que determinou a criação de um banco de peritos que contenha um cadastro de todos os profissionais que se interessem em ser peritos.
Contudo, em Minas Gerais, dentre outros estados da federação, isso ainda não foi feito, o que representa um atraso na prática processual. Com o sorteio que deverá ser realizado dentre os cadastrados, o banco de peritos permitirá que um maior número de profissionais faça perícia de forma mais equitativa.
No que diz respeito ao Assistente Técnico das partes, a questão é de outra ordem, já que a parte é livre para ter ou não um assistente técnico, podendo escolher quem quer que seja para desempenhar tal tarefa, incluindo pessoas sem a formação específica do objeto da perícia. Isso não retira a importância da parte ter um profissional habilitado para ser seu assistente técnico. Mas, não sendo este um expert, o risco é da parte, sendo que a lei processual não proíbe.
O objeto da perícia
Na prática, vemos que mesmo os profissionais formados e habilitados na matéria objeto da perícia, e que às vezes já atuam como peritos, não estão devidamente preparados para a tarefa. Um perito que conhece bem a matéria científica a ser periciada, muitas vezes conduz mal a perícia porque não compreende o objeto dela, porque essa dedução deveria decorrer da compreensão que ele tem do que se objetiva com a própria ação e o que gera a necessidade da perícia. Ao contrário do que alguns peritos temem, não é necessário que tenham conhecimentos do direito que está em jogo. Mas é necessário que o perito domine todas as regras processuais previstas sobre perito e perícia.
Conhecendo-as, sua visão se modifica. Percebe porque o juiz precisa de sua perícia, embora o perito não saiba o que a lei ou jurisprudência dizem sobre o caso a ser periciado. Consegue delimitar bem o objeto da perícia e estabelecer o método necessário para a sua realização.
Perícia em direito imobiliário – O perito deve focar na sua ciência e não no direito discutido
No campo do Direito Imobiliário a perícia feita por engenheiros é muito recorrente. Numa ação em que se discuta, por exemplo, o direito do morador de uma cobertura pagar a taxa de condomínio no mesmo valor e percentual de todos os demais moradores, muitas vezes o perito se confunde. Tal ação é fundada na tese de que a taxa de condomínio refere-se aos serviços comuns prestados a todos os condôminos e que isso independe do tamanho de cada apartamento, ou seja, quem mora na cobertura ou nos apartamentos com áreas privativas, não usam mais o porteiro, ou a luz do corredor, ou a limpeza do prédio.
Designado um engenheiro para averiguar como se dá o uso das partes comuns pelos moradores do prédio, o mesmo, com a ideia fixa de que “em todo condomínio o morador da cobertura paga mais e isso deve se manter assim”, porque querem que o critério seja o de percentual da taxa proporcional à fração ideal de cada apartamento, o perito engenheiro afirma e reafirma que, mesmo não existindo nada que demonstre que o morador da cobertura não usa mais as áreas comuns e nem os serviços prestados igualmente aos condôminos, a sua taxa de condomínio deve ser maior porque seu apartamento é maior.
Observamos facilmente que o perito deixou o objeto da perícia, que era averiguar como cada condômino usa as áreas comuns e como recebem os serviços prestados, e passa a focar na noção de direito que ele tem sobre o assunto. Em verdade, se o juiz vai declarar que de fato o morador da cobertura deva pagar igual aos demais ou com base na fração ideal do seu imóvel, não importa para a perícia, bem como não importa para a perícia o que a lei diz sobre isso porque a parte autora entrou com a ação justamente para discutir a lei, e ela apresenta um fundamento jurídico plausível que somente o juiz irá enfrentar. A lei, no Brasil, não é absoluta. Não é um dogma, e as pessoas têm direito de questionar em juízo direitos que podem estar sendo prejudicados, inclusive, pela própria lei.
De forma semelhante, um engenheiro que faz perícia em imóvel comercial visando avaliar o preço de mercado para fins de Revisional de aluguel, que, ao final dos cálculos advindos de um método previsto em norma da ABNT, entende que o valor ficou “barato”, às vezes, resolve abandonar o método da ABNT e instituir o próprio método que leve a um resultado mais “justo” porque na visão dele aquele preço está baixo. Isso traz implicações severas, porque um perito que escolhe abandonar um método preestabelecido e aceito pela sua comunidade científica, corre o risco de produzir resultados não apenas errados, mas considerados inverdades, o que pode trazer para ele uma condenação tanto de natureza civil, que o impedirá de fazer novas perícias por até 5 anos, o obrigará a indenizar a parte e terá seu Conselho Profissional oficiado, como também pode ter uma condenação pelo Crime de Falsa Perícia previsto no artigo 342 do Código Penal. E veja que muitas vezes o perito “só” achou que estava barato, porque na visão dele a decoração do lugar era muito luxuosa, ou destoava de outro comerciante de igual ramo na mesma região, porque tinha a aparência de que o faturamento do empreendimento era muito elevado. O perito, assim como a justiça deve ter os olhos vendados para as impressões e deixar sua ciência operar o “milagre” pericial, que mostrará a verdade.
Profissionais que fazem perícia em juízo devem se atualizar
Os peritos judiciais deverão se adequar a uma nova realidade quanto à produção de prova pericial que impôs requisitos formais, devendo o laudo conter, entre outros, o objeto da perícia e o método utilizado e a demonstração de que esse método seja aceito cientificamente.
Portanto, as perícias exigirão que os peritos estejam aptos a atender essas novidades sob pena de terem seus laudos impugnados pelo réu ou pelo autor que se sentir prejudicado.
Logicamente, sendo o perito um auxiliar do juiz, caberá a ele elaborar seu trabalho com perfeição, evitando assim críticas que venham a gerar retrabalho e atrasar o andamento do processo. E mais: muitos processos que necessitaram de perícias judiciais antes da vigência do Novo Código de Processo Civil (18/05/2016), terão as perícias devolvidas para os peritos para que adequem o laudo pericial às novas regras, tendo em vista que a nova lei atinge os processos em andamento.
Quanto mais cedo o perito se atualizar, melhor será o seu desempenho profissional e maior a sua contribuição com a Justiça, sendo que o juiz terá que mencionar o laudo pericial e o método nele utilizados, mesmo que o laudo em nada influencie em sua decisão, como podemos constatar no artigo 479 do CPC: “O juiz apreciará a prova pericial de acordo com o disposto no art. 371, indicando na sentença os motivos que o levaram a considerar ou a deixar de considerar as conclusões do laudo, levando em conta o método utilizado pelo perito”. As partes do processo têm o direito de solicitar a adequação da perícia para que contenha os novos requisitos. Todos terão que se adequar em prol de uma justiça mais eficiente.
Daniela Almeida Tonholli - Advogada
Fonte: Diário das Leis
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