Hoje em dia tanto as relações obrigacionais quanto as de consumo necessitam de um amparo legal para que não fiquem a luz de irregularidades em eventuais problemas que possam surgir. A corretagem é um dos contratos em que podem-se encontrar problemas na sua efetivação, pois como se trata de um serviço, é de difícil constatação pois envolve o fator humano.
Para melhor entendimento, deve-se demonstrar as diferentes maneiras de como um profissional pode atuar no mercado, vinculado a uma imobiliária ou não.
1.1 A ATUAÇÃO NO MERCADO DE IMÓVEIS
No mercado atual, diferentes são as maneiras de um profissional atuar neste ramo. Há os que atuam de maneira autônoma, e há os que atuam de forma vinculada a uma imobiliária, sendo que este vínculo pode ser empregatício ou não.
Conceito já abordado anteriormente, o corretor de imóveis é o profissional que intermedia ou aproxima, o adquirente e o proprietário para realização de um negócio jurídico relacionado a algum bem imóvel. Segundo a magistrada Véra Maria Jacob de Fradera (2003, p.111), a atividade profissional de corretagem de imóveis, “consiste na intermediação da venda de imóveis. Trata-se de profissional liberal, prestador de trabalho autônomo, independentemente de contratação formal. É regido pelas normas específicas do Código Civil (lei 10.406/02), do Código de Defesa do Consumidor (lei 8.078/90), da lei número 6.530/78 e Decreto Lei número 81.871/78, além de portarias de sindicatos e órgãos relacionados. A categoria de profissionais ainda possui um Código de Ética, a Resolução número 326/92.
1.2 RESPONSABILIDADE SUBJETIVA DOS PROFISSIONAIS LIBERAIS
No direito pátrio existem diferenças nestas maneiras de atuação, pois a relação com um cliente poderá variar no que tange à responsabilidade profissional. Necessário esclarecer que a categoria profissional de corretores de imóveis foi inclusa no rol de profissionais liberais, e que consequentemente ficou suscetível ao estatuto da Confederação Nacional dos Profissionais Liberais (CNPL), que em seu artigo 1o, parágrafo único, que leciona:
Aquele legalmente habilitado a prestação de serviços de natureza técnico-científica de cunho profissional com a liberdade de execução que lhe é assegurada pelos princípios normativos de sua profissão, independentemente de vínculo da prestação de serviço (BRASIL, 1954).
Conforme o artigo em epígrafe, o corretor de imóveis, sendo profissional liberal, poderá abrir uma sede comercial para poder atender o público em geral, sem a necessidade de criar uma pessoa jurídica, apenas inscrever-se junto a prefeitura local. Poderá admitir empregados somente para tarefas administrativas, e somente exercer a atividade de corretagem o profissional habilitado no conselho.
Segundo a doutrina o profissional liberal recebe um outro conceito, conforme a obra intitulada de Vocabulário Jurídico de Plácido e Silva, e sobre a profissão liberal entende-se que:
Pela adjetivação liberal, do latim liberalis, de liber (livre), literalmente, assim se deve entender toda profissão, que possa ser exercida com autonomia, isto é, livre de qualquer subordinação a um patrão ou chefe (SILVA, 2006, p. 1.108).
Nessa condição, onde o corretor que exerce a atividade como um profissional liberal com escritório imobiliário próprio, terá a responsabilidade civil ligada diretamente a ele, visto que somente ele irá exercer a atividade fim da empresa. Destarte, o profissional liberal – pessoa natural – não está sujeita ao regime objetivo do Código Consumerista (BRASIL, 1990), por estar ressalvada pelo artigo 14, §4o, que trata que “A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa”.
Anote-se, todavia, conforme Antonio Mathias Coltro, cita o Agravo de Instrumento da 34a Vara Cível de São Paulo, que concluiu o seguinte tema:
RESPONSABILIDADE CIVIL – CORRETAGEM – TUTELA ANTECIPADA – DEMONSTRAÇÃO DE DANO E NEXO CAUSAL – INSUFICIÊNCIA – DOLO OU CULPA DA CORRETORA – COMPROVAÇÃO – NECESSIDADE. A antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional reclama, em ação de indenização embasado em contrato de corretagem, prova segura dos fatos que tornem verossímil a alegação de conduta dolosa ou culposa da corretora, não bastando simples demonstração de dano e nexo causal. (COLTRO, 2011, p. 89).
No caso em epigrafe, foi afastada totalmente a possibilidade de uma antecipação de tutela, que adotaria a responsabilidade objetiva para a concessão deste benefício. E isto se dá à luz do Código de Defesa do Consumidor, que ressalvou os profissionais liberais, e que possui, assim como o Código Civil um princípio regente, o da boa-fé dos contratos, que norteia a idéia de responsabilidade civil. Como o tribunal do Rio Grande do Sul, contudo, observou:
APELAÇÃO CÍVEL. PROMESSA DE COMPRA E VENDA. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO CORRETOR DE IMÓVEIS. HIPOTECA. PROMESSA DE LIBERAÇÃO EM PRAZO EXÍGUO. AUSÊNCIA DE REALIZAÇÃO DE DILIGÊNCIAS VISANDO A LIBERAÇÃO CÉLERE. PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA. DANO MORAL. OCORRÊNCIA. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. I. Hipótese na qual autora firma contrato de promessa de compra e venda com réu, cujo objeto era um imóvel no município de Imbé, e o pagamento se daria por meio de transferência bancária e dação em pagamento de imóvel localizado em Porto Alegre. II. Imóvel objeto da dação em pagamento que havia sido dado como garantia hipotecária, tendo o réu se comprometido a providenciar a liberação do imóvel em prazo exíguo, e, posteriormente, não diligencia adequadamente para garantir o cumprimento do prazo, ferindo, assim, o princípio da boa-fé objetiva nos contratos, o qual impede que uma das partes cause dano à outra. III. Ausência da efetiva comprovação do dano material no que diz com a frustração de realização de outro negócio envolvendo o imóvel objeto da dação em pagamento. IV. Ilegitimidade passiva do corretor de imóveis, tendo ele sido responsável tão somente pela aproximação das partes e intermediação do negócio. APELOS DESPROVIDOS. UNÂNIME (Apelação Cível Nº 70047468939, Décima Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Liege Puricelli Pires, Julgado em 24/05/2012).
A boa-fé descrita na decisão é o princípio orientador do CDC, que também é encontrado no novo Código Civil. Sobre o tema, dispõe Claudia Lima Marques (2011, p. 826), que diz que “o caput do art. 4.o do CDC menciona, além de transparência, a necessária harmonia das relações de consumo. Esta harmonia será buscada através da exigência de boa-fé nas relações entre consumidor e fornecedor”.
Há que se demonstrar que as imobiliárias são figuras equiparadas e consideradas corretores de imóveis perante a lei 6.530 (BRASIL, 1978), denominada Estatuto dos Corretores de imóveis, que em seu artigo 6o dispõe que “As pessoas jurídicas inscritas no Conselho Regional de Corretores de Imóveis sujeitam-se aos mesmos deveres e têm os mesmos direitos das pessoas físicas nele inscritas”. Porém ao observar a maneira de atuação das empresas, vislumbra-se por fim, que as imobiliárias não estão inclusas no rol da categoria de profissionais liberais, excluindo portanto da ressalva do artigo 14, §4o do Código de Defesa do Consumidor, considerando-se assim fornecedora para uma relação de consumo.
1.3 RESPONSABILIDADE OBJETIVA DAS IMOBILIÁRIAS
Não obstante a atividade de corretagem inclui uma outra parte no negócio jurídico, o vendedor ou comprador do imóvel em questão. A empresa trabalha como intermediadora de negócios, ficando num polo intermediário de uma negociação, e tendo a obrigação de aproximar as partes demonstrando todas as vantagens e desvantagens do negócio. O que significa que a relação da empresa com o cliente, seja de prestação de serviços, onde a empresa atua como uma procuradora do cliente comprador ou vendedor, ou da empresa incorporadora.
Algumas decisões dos tribunais configuram a relação estabelecida entre clientes e empresas imobiliárias/corretores de imóveis como consumerista, ou seja, onde se aplica os preceitos do Código de Defesa do Consumidor, conforme colaciona-se da decisão do Ministro Sidnei Beneti da Terceira Turma do STJ conforme o Recurso Especial de número 0190129-0:
É possível a aplicação do CDC à relação jurídica firmada entre o promitente comprador e a corretora imobiliária para realização de negócio de compra e venda de imóvel, tendo em vista que os serviços oferecidos pela empresa de corretagem de imóveis são bens juridicamente consumíveis, remunerados, servem para suprir a necessidade do comprador, destinatário final do serviço, restando caracterizada a relação de consumo, conforme se depreende da leitura dos artigos 2º e 3º do CDC (REsp. 1087225, STJ, Relator: Min. Sidnei Beneti, julgado em: 16/11/2010).
Ademais foi claro quanto à incidência da norma consumerista, demonstrando que relação entre cliente e empresa prestadora de serviços se configura na maioria dos casos como relação de consumo. No mesmo sentido, o recurso especial 0115932-7 impetrado no STJ, teve o mesmo entendimento, conforme a ementa:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL, CIVIL E DO CONSUMIDOR. RECURSO ESPECIAL. REEXAME DE PROVAS. INVIABILIDADE. PREQUESTIONAMENTO DE TESE. IMPRESCINDIBILIDADE. CORRETORA QUE INTERMEDEIA A CELEBRAÇÃO DE CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA QUE, DESDE A ORIGEM, MOSTRAVA-SE NULO, VISTO QUE A VENDEDORA TIVERA A FALÊNCIA DECRETADA CERCA DE UM ANO ANTES E O BEM IMÓVEL ENCONTRAVA-SE PENHORADO. INDENIZAÇÃO POR PERDAS E DANOS. POSSIBILIDADE.
[...]2. Ademais, a moldura fática aponta, no que as partes não controvertem, que a recorrente promoveu a veiculação de publicidade do imóvel - inclusive, foi o que atraiu a autora para a oferta -, o qual estava há muito penhorado e já pertencia à massa falida, isto é, não estava mais sob a gestão dos administradores da Conenge. Com efeito, apurada a patente negligência da recorrente quanto às cautelas que são esperadas de quem promove anúncio publicitário - ainda que não afirmada a má-fé, nos termos do artigo 37, § 1º, do CDC, também por esse fato é cabível o reconhecimento de sua responsabilidade, visto que a publicidade mostrara-se idônea para induzir a consumidora em erro. (REsp. n. 1266937, STJ, Relator: Min. Luis Felipe Salomão, julgado em: 06/12/2011, grifo do autor)
Constata-se que os magistrados votaram pela responsabilidade civil objetiva, decorrente das normas consumeristas e das relações de consumo, excluindo o fator culpa do agente para a eventual responsabilização. Isso por que, na maioria das vezes esse tipo de serviço é prestado por corretores ou empresas que tem habitualidade no ramo, caracterizando ser uma fornecedora.
Todavia alguns tribunais revelam-se contrários a este entendimento de que a responsabilização não dependeria da culpa da empresa ou corretor, como percebe-se na decisão do tribunal de justiça do Rio Grande do Sul, conforme colaciona-se:
RESPONSABILIDADE CIVIL. DESMEMBRAMENTO. ILEGITIMIDADE PASSIVA
1.- A imobiliária não é responsável pelo cumprimento de obrigação que deveria ser realizada pelo proprietário.
2.- Ilegitimidade passiva reconhecida.
3.- A imobiliária ou corretor de imóveis é responsável perante o adquirente por circunstâncias que omitiram ou teriam condições de saber. A atividade de aproximação não acarreta responsabilidade solidária para com o conteúdo do negócio.
Negado provimento (Recurso inominado n. 71002088201, 3a turma TjRS, relator: Eduardo Kraemer, julgado em 29/10/2010).
No caso exposto percebe-se que o magistrado afastou a responsabilidade da empresa ré, por um fato que a mesma desconhecia, ou seja, no caso em questão foi afastada a legitimidade da imobiliária. Caso em que foge a regra do sistema de responsabilização independentemente de culpa, pois foi necessário provar se a imobiliária tinha culpa ou não no defeito do negócio, caracterizando a responsabilidade civil subjetiva, constante como regra geral do Código Civil.
Poderíamos dizer que ocorreu um diálogo entre as fontes de direito da atividade relacionada, utilizou-se o Código Civil ao invés do Código de Defesa do Consumidor. Tal técnica foi criada para suprimir a complexidade do sistema jurídico pós-moderno, e que com o advento das leis foi necessária para a hermenêutica do direito. Consoante a tese, Claudia Lima Marques explica uma das formas de aplicação do diálogo das fontes:
Na aplicação simultânea de duas leis, uma lei pode servir de base conceitual para a outra (diálogo sistemático de coerência), especialmente se uma lei é geral e a outra especial, se uma é a lei central do sistema e a outra um microssistema específico, não completo materialmente, apenas com completude subjetiva de tutela de um grupo da sociedade (MARQUES, 2011, p.719).
Portanto é consoante a doutrina, o magistrado que aplica a decisão conforme o caso concreto, podendo utilizar das duas fontes de direito possíveis a lide. Conferindo às decisões um caráter mais justo e de maior aprofundamento no âmbito das relações jurídicas da atividade de corretagem.
1.4 RESPONSABILIDADE DA IMOBILIÁRIAS PELOS PROFISSIONAIS CORRETORES DE IMÓVEIS
Numa imobiliária que atua no mercado, utilizando de forma habitual diversos corretores, há duas possiblidades de contratação da mão de obra. A primeira delas é a mais costumeira, onde o profissional autônomo trabalha sendo remunerado mediante comissões, que são ajustadas no momento de cada negócio, portanto sua condição é de certa instabilidade, visto que não é detentor de direitos trabalhistas, regulamentado pela Consolidação das Leis do Trabalho. O que na prática traz inúmeras ocorrências de ações judiciais de tais profissionais pleiteando os direitos trabalhistas, como férias, décimo terceiro salários, entre outras.
Porém há também outra forma de contratação de corretores de imóveis nas empresas do ramo imobiliário, onde os profissionais autônomos são efetivamente ligados a empresa através de um contrato de trabalho, com carteira de trabalho assinada. Do mesmo modo, Vera Maria Jacob de Fradera que em seu parecer jurídico delineou as maneiras de atuação dessas empresas:
Não obstante sua qualificação como profissional liberal, nada impede que o corretor de imóveis atue na condição de empregado da empresa imobiliária, em que tem contrato de trabalho, carteira de trabalho assinada, salário, recolhimento de previdência social, férias anuais, 13o salário, horário de trabalho preestabelecido pela empresa e pagamento dos domingos e dias feriados trabalhados. Existem, pois, duas formas de atuação do corretor de imóveis no mercado imobiliário, com ou sem vínculo empregatício (FRADERA, 2003, p.112).
Eis que reside uma dúvida na esfera civil, onde se pergunta se a empresa prestadora de serviços imobiliários, que não possui vínculo empregatício com seus corretores tem a mesma incidência de responsabilidade civil sobre as empresas que possuem apenas corretores cadastrados?
Primeiramente, a resposta é sim, pois tais empresas são juridicamente consideradas fornecedoras de serviços. No entanto, pode-se verificar que a interpretação do magistrado pode, conforme caso concreto, afastar a incidência de responsabilidade de uma pessoa jurídica, visto que, toda relação jurídica tem suas ressalvas.
Sabe-se que a natureza da relação entre os corretores e imobiliárias são diferentes, sendo uma de cunho civil e outra de cunho trabalhista, e que nas duas formas, a empresa tem responsabilidade sobre os seus corretores, sendo empregados ou não. Sendo assim, é inegável que empresas que atuam no ramo com corretores contratados ou não, serão tratadas de forma a ser responsáveis por seus corretores, em ambos casos.
1.5 RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA
A divergência de decisões verte-se no modo como a atividade de corretagem é por si só. Uma empresa ou corretor, se responsabiliza por duas partes no negócio, o comprador e o vendedor, sendo que nem sempre é possível tomar todas as precauções necessárias para o negócio correr de forma totalmente segura. Pode facilmente ocorrer uma omissão de informação do negócio para a empresa ou corretor de imóveis, onde o cliente pode eximir-se de prestar informações para obter benefício próprio. Percebe-se que quando a culpa é presumida, os magistrados consideram o cliente como consumidor final da prestação de serviço, e caracterizam o comitente como parte mais fraca da relação, e o corretor como fornecedor de serviços que deve assumir os riscos da atividade econômica.
Num eventual litígio, o cliente deverá saber quem foi o responsável pelo dano decorrente de uma violação obrigacional. Por exemplo, numa compra e venda em que o adquirente tratou diretamente com um corretor credenciado, e que este trabalha em uma empresa de venda de imóveis, um dos agentes seria responsável civilmente por uma prestação de serviços defeituosa. A dúvida surge no campo da legitimidade passiva de uma ação, onde teríamos três opções neste caso, o corretor de imóveis, a imobiliária e o vendedor. Ao mesmo respeito, a terceira turma cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, acolheu o seguinte recurso:
INDENIZATÓRIA. COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. DÍVIDA CONDOMINIAL NÃO COMUNICADA AO COMPRADOR. EVIDENCIADA A CULPA DA IMOBILIÁRIA E DO CORRETOR. SOLIDARIEDADE. Há nos autos elementos indiciários fortes e verossímeis no sentido de que todos os requeridos tinham ciência da dívida condominial, omitida ao adquirente. O réu Júnior, saliente-se, diz com corretor e funcionário da imobiliária requerida, ostentando, igualmente, a condição de ex-proprietário do imóvel. Em relação à imobiliária, conquanto não seja absolutamente convergente a jurisprudência neste sentido, filio-me a orientação no sentido de que em hipóteses tais os serviços oferecidos pela empresa de corretagem de imóveis são bens juridicamente consumíveis, de modo a caracterizar uma relação de consumo, conforme se depreende da leiturados artigos 2º e 3º do CDC. Todavia, não há elementos a comprovar que a imobiliária estivesse imbuída de má-fé, quiçá acreditasse que o vendedor, recebendo o valor pago, quitaria a dívida condominial. Contudo, isso no mínimo indica imprudência no trato do negócio, em relação a todos os que intermediaram a negociação, perfazendo assim um dos requisitos para responsabilidade civil, o nexo de imputação, a culpa, como preceitua os artigos 186 c/c 927 do Código Civil. A solidariedade, como sabido, resulta da lei ou da vontade das partes, o que no caso, incide a primeira hipótese, como preceitua expressamente o artigo 942, caput, segunda parte do Código Civil e artigo 7º, parágrafo único do CODECON. Destarte, há efetivamente solidariedade dos requeridos, razão a justificar a legitimação e condenação de todos os demandados na reparação do dano ao autor. RECURSO PROVIDO. (Recurso Cível Nº 71003753985, Terceira Turma Recursal Cível TJRS, Turmas Recursais, Relator: Marta Borges Ortiz, Julgado em 28/09/2012).
A imprudência do negócio configurou a responsabilidade civil objetiva solidária do corretor e da imobiliária, que deveriam ter tomado as devidas precauções quanto ao negócio. Embora a responsabilidade civil objetiva foi recorrente das normas protetivas do Código de Defesa do Consumidor, a solidariedade está presente tanto nesta quanto no Código Civil brasileiro. Em seu artigo 34, o CDC (BRASIL, 1990) trata expressamente que, “O fornecedor do produto ou serviço é solidariamente responsável pelos atos de seus prepostos ou representantes autônomos”. E da mesma maneira o artigo 942 c/c 932 do Código Civil, institui pessoas solidariamente responsáveis, e que Carlos Roberto Gonçalves refere-se em sua ilustre obra:
Assim, ocorre a solidariedade não só nos caso de concorrer uma pluralidade de agentes, como também entre pessoas designadas no art. 932 do Código Civil: pais e filhos, empregadores e empregados etc. Em consequência, a vítima pode mover a ação contra qualquer um ou contra todos os devedores solidários. (GONÇALVES, 2010, p. 132).
Sendo assim a imobiliária, mesmo no sentido de mera agente que contrata os serviços dos seus corretores sem vínculo empregatício, detém responsabilidade sobre seus prepostos.
1.6 DIREITO DE REGRESSO
O instituto da responsabilidade solidária é claro quanto a possibilidade do autor da ação, chamar a lide qualquer um dos réus, ou chamar todos os responsáveis pelo danos da decorrentes da ação. A solidariedade atinge portanto os fornecedores de serviços, como dita o CDC, que mesmo não tratando expressamente, entende-se que há a solidariedade entre fornecedores de serviços.
O Código de Defesa do Consumidor (BRASIL, 1990) institui expressamente nos artigo 12 e 13, a responsabilidade do comerciante sobre a solidariedade com seus empregados. Contudo faz uma ressalva no parágrafo único do artigo 13, prescrevendo que, “Aquele que efetivar o pagamento ao prejudicado poderá exercer o direito de regresso contra os demais responsáveis, segundo sua participação na causação do evento danoso”.
Percebe-se que o diploma se refere expressamente a fornecedores de produtos e comerciantes, mas não se posiciona. No artigo 14, em relação aos fornecedores de serviços, diz que apenas que será responsabilizado o fornecedor independentemente de culpa. No campo da responsabilidade objetiva, adotada como regra geral do Código de Defesa do Consumidor, haverá sempre a solidariedade entre agentes, mesmo que não expressa no diploma. É o que defende o autor Leonardo Roscoe Bessa advertindo que:
A solidariedade passiva entre os prestadores de serviço significa, em termos práticos, que qualquer deles pode ser acionado pelo consumidor para exercício de uma das três alternativas indicadas pelo art. 20 (a re-execução dos serviços, quando cabível, a restituição imediata de quantia paga ou o abatimento proporcional do preço) (BESSA, 2009, p. 160).
Há de ser interpretado de forma equiparada aos fornecedores de produtos para abordagem em relação aos prestadores de serviços. E havendo a responsabilidade objetiva, haverá o direito de regresso dos agentes causadores.
Acontece porém, que em casos específicos, o fornecedor, mesmo tomando todas as precauções necessárias, não tem o total controle sobre seus empregados ou profissionais autônomos que prestam serviços em nome da empresa. É o que acontece por exemplo nas imobiliárias que detém responsabilidade sobre diversos corretores, que atuam de forma livre a atividade de corretagem.
De se observar, outrossim a decisão da Primeira Câmara de direito Público, que entende que:
PROCESSUAL. DENUNCIAÇÃO À LIDE. AÇÃO PRINCIPAL QUE SE REFERE À ANULAÇÃO DE COMPRA E VENDA DE TERRENO. SUPOSTA FRAUDE NA PROCURAÇÃO OUTORGADA PELOS ALIENANTES DO BEM. ADQUIRENTES DO IMÓVEL QUE PRETENDEM A DENUNCIAÇÃO DA IMOBILIÁRIA À QUAL ESTÁ VINCULADO O CORRETOR DE IMÓVEIS, BEM COMO DO TABELIONATO QUE LAVROU A ESCRITURA PÚBLICA DE COMPRA E VENDA E QUE, POR TAMBÉM ACUMULAR A QUALIDADE DE REGISTRADOR, PROCEDEU AO REGISTRO DAQUELA. IMPOSSIBILIDADE. CORRETOR DE IMÓVEIS QUE, SEGUNDO AS PROVAS CARREADAS AOS AUTOS, AGIU APENAS EM SEU NOME, SEM NENHUMA INGERÊNCIA DA IMOBILIÁRIA. TABELIONATO QUE, SEGUNDO JULGADO DESTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA, PODE SER RESPONSABILIZADO. FEITO PRINCIPAL QUE SE ENCONTRA EM FASE DE ALEGAÇÕES FINAIS. ACOLHIMENTO DA DENUNCIAÇÃO À LIDE QUE GERARÁ TUMULTO PROCESSUAL E PREJUÍZO À INSTRUMENTALIDADE DO PROCESSO. POSSIBILIDADE DE GARANTIA À EVENTUAL DIREITO DE REGRESSO EM AÇÃO PRÓPRIA. RECURSO DESPROVIDO. Não há no feito nenhuma prova que demonstre que o corretor de imóveis, detentor da procuração dita falsa e que procedeu à alienação do bem, tenha agido em nome da imobiliária especificada pelos agravantes (Agravo de instrumento n. 012136-7, Primeira Câmara de Direito Público SC, Relator: Vanderlei Romer, Julgado em: 18/08/2009)
Percebe-se que no caso em apreço percebe-se que ocorreu a solidariedade solidária entre corretor de imóveis e imobiliária, contudo, em sede de regresso, a imobiliária teve o direito de cobrar diretamente do causador principal do dano, que nesse caso foi o corretor, que agiu totalmente em seu nome, sem comunicar a empresa das ações ilegais.
Como o Código Consumerista é detentor de normas protetivas aos consumidores, o direito de regresso vem como uma resposta ao encargo que o fornecedor, seja ele de produtos ou serviços, tem em relação à atitudes ou ações incorretas dos seus profissionais. Claudia Lima Marques leciona acerca do direito de regresso:
Trata-se, portanto, no momento do regresso, de uma espécie de solidariedade imperfeita, pois não tem causa única, mas cada um seria responsável no momento final, isto é frente a frente com os outros fornecedores, por sua participação na causação do defeito do produto ou serviço, do resultado (MARQUES, 2011, p. 1.280).
O regresso quanto ao causador principal, ocorrerá após o pagamento do responsável solidário pela indenização devida numa ação vencida. Acontece em casos que somente um dos responsáveis é chamado ao processo, e acaba tendo que suportar todo o ônus pecuniário de uma ação de indenização. Para suprir o feito, terá o agente pagador, o direito de regressar em ação autônoma. Consoante a este entendimento, Antonio Herman de Vasconcelos Benjamin:
Em quaisquer dos casos, o direito de regresso é assegurado ao prestador de serviços que se viu prejudicado. O artigo 13, parágrafo único do CDC garante aos comerciantes o direito de regresso contra os demais responsáveis, pois nem sempre quem paga causou o dano sozinho (BENJAMIN, 2009, p.137).
Sendo assim, a imobiliária que foi responsabilizada por um corretor, autônomo ou empregado, poderá pela via judicial regressar ao agente responsável pelo dano, o seu direito a indenização, salvo se esta se provar ciente da causa. Apresenta-se então dois momentos na área de responsabilização das relações de consumo, a primeira, pela via objetiva, onde independe a comprovação de culpa, e a segunda pela via subjetiva, onde o direito de regresso é garantido com a comprovação de culpa do verdadeiro causador do dano.
Sabe-se portanto que como relação de consumo, a atividade de corretagem está inserida no atmosfera da norma consumerista. O caráter protecionista da norma faz com que nas relações de consumo, exista um equilíbrio entre as partes, de forma que o consumidor tem benefícios em relação ao fornecedor que constitui forma mais forte na relação.
O sistema de responsabilização do Código de Defesa do Consumidor, chamado pela doutrina de teoria do risco, presume a culpa do agente causador do dano. E nos casos de empresas, também respondem por seus profissionais ou empregados que representem a imobiliária. Além destas vantagens, o sistema de responsabilização objetiva trouxe inovações processuais, que em suma são três, a inversão do ônus da prova, o sistema de nulidades contratuais e a solidariedade.
Para os profissionais liberais, o Código de Defesa do Consumidor fez uma ressalva, excluindo-se portanto da responsabilidade objetiva e incluindo automaticamente no instituto de responsabilidade subjetiva, onde é necessário a comprovação da culpa do agente. No entanto, não o exclui totalmente da interpretação do caso conforme o Código consumerista, já que os magistrados poderão utilizar-se de qualquer um dos diplomas aplicáveis no âmbito civil, posto que estes diplomas estão em vigência paralelamente. Assim é o chamado Diálogo das Fontes, hoje já aplicado no complexo sistema jurídico moderno.
Ocorre nos casos de responsabilização solidária de imobiliárias e corretores, em que o corretor cometa um ato ilícito sem conhecimento da empresa, esta será responsável, mas com direito de regressar em ação contra o verdadeiro causador do dano. É os contornos da lei, onde todos terão seu direito garantido de uma forma ou de outra, sempre assegurando o direito de restituir seu direito lesado.
Cristiano Cardoso - Empresário do ramo imobiliário, formado em gestão imobiliária e direito.
Fonte: DireitoNet
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