terça-feira, 28 de abril de 2015

SALVADOR - AINDA SOBRE A OUTORGA ONEROSA


O presidente da Ademi, em réplica ao artigo "Onerosa para quem?", afirma, em defesa dos interesses do mercado imobiliário, que sustento "uma visão equivocada e sem fundamentos técnicos". E se utiliza para isso de argumentos nada técnicos para impor sua visão unilateral da realidade, a de que o desemprego na construção civil atingiria níveis alarmantes e a cidade seria paralisada caso os valores da outorga fossem mantidos, defendendo interesses privados travestidos de interesse geral.

Ora, não existe "interesse geral" e "bem comum" em uma cidade desigual e contraditória como Salvador. O que existe são interesses particulares em disputa, que precisam ser claramente colocados e negociados em audiências públicas e no Conselho Municipal: sem participação popular o "bem comum" é uma teorização especulativa que esconde o caráter conflitivo dos interesses em jogo.

O presidente da Ademi faria um grande favor se esclarecesse que empreendimentos deixaram de ser lançados e quais as perdas reais do setor, bem como a margem de lucro com a qual opera, qual a qualidade dos empregos que deixaram de ser gerados etc. Soa equivocado dizer que "perdem as empresas e os cidadãos" com os novos valores da outorga. Para quais cidadãos foram pensados os empreendimentos que defende? O IPTU atrelado ao VUP é pago por todos os cidadãos e a maioria não acha que os (altos) valores foram amenizados por "travas previstas na lei".

Muricy Fontes precisa conhecer melhor o Estatuto da Cidade e os instrumentos urbanísticos como a Outorga Onerosa, que buscam recuperar parte dos investimentos públicos para compensar novas demandas geradas por altas densidades. Ao afirmar que a "outorga é o instrumento (...) pelo qual o proprietário de um terreno paga à prefeitura para construir com o coeficiente máximo de aproveitamento", esquece que o que se quer é evitar e não favorecer construir sempre com coeficientes máximos, o que compromete a qualidade de vida urbana.

Quem assim o deseja deve mesmo pagar caro por isso para fazê-lo e esses recursos deveriam alimentar um fundo municipal para investimentos na cidade. Ele também não informa aos leitores que o projeto de lei encaminhado pelo prefeito à Câmara Municipal, para alterar os valores da outorga, extingue o fundo municipal, algo inexplicável e que faz pensar para onde irão os valores pagos como contrapartida e quem e como vai gerir esses recursos.

Em meu artigo não sustento que o projeto altera o PDDU vigente, até porque o momento é de discussão de um novo plano diretor e de uma nova lei de ordenamento do solo para a cidade. Então, ao distorcer o que escrevi, o presidente da Ademi perde também a chance de explicar por que a pressa em aprovar a alteração dos valores da outorga esquivando-se dos debates sobre o PDDU e a Louos, por que o receio de incorporar a questão dos valores da outorga ao processo maior de discussão, não explicando toda a pressão para votação à parte das mudanças que propõe!

Angelo Serpa - Professor titular da Ufba e pesquisador do CNPq
Fonte: Portal A TARDE

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