quinta-feira, 25 de fevereiro de 2021

A não incidência de ITBI sobre a promessa de compra e venda


Antes de adentrar na possibilidade incidência de Imposto de Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) em contratos de promessa de compra e venda, faz-se necessário compreender a natureza jurídica do imposto e do contrato, respectivamente. O ITBI é um tributo de competência municipal, cobrado quando há transferências onerosas de imóveis. O pagamento do imposto, previsto no inciso II do artigo 156 da Constituição Federal, é utilizado como meio utilizado pelo comprador para regularizar o imóvel, bem como para garantir seu acesso a serviços básicos, como água, luz e coleta de lixo.

O contrato de promessa de compra e venda, por sua vez, é um instrumento preliminar, cujo objeto é a futura celebração de contrato definitivo. A promessa, então, gera a obrigação de comprar ou de vender o imóvel, de acordo com o valor, prazo e demais condições estabelecidas entre os promitentes.

Nesse sentido, há grande discussão acerca da possibilidade de incidência do Imposto de Transmissão de Bens Imóveis sobre a promessa de compra e venda. Isso porque o vocábulo "transmissão" induz o leitor a presumir que o tributo incide apenas no momento da cessão onerosa do imóvel — o que ocorre na prática. Contudo, parte dos juristas defende que, de acordo com o Código Civil, a Constituição Federal e o Código Tributário, tal entendimento seria infundado.

Para isso, aduzem que a Constituição Federal estabelece três hipóteses para a incidência do ITBI, quais sejam: 1) a transmissão intervivos de bens imóveis a qualquer título e por ato oneroso; 2) a transmissão intervivos de "direitos reais" sobre imóveis, exceto os de garantia; e 3) a cessão de direitos à aquisição de "direitos reais" sobre imóveis.

A hipótese elencada no item 2 é a que desencadeia debates mais intensos. Para parte dos juristas, esse dispositivo da Carta Magna legitimaria o pagamento do tributo mesmo quando celebrado contrato de promessa de compra e venda. Isso pois o Código Civil, em seu artigo 1.417, estabelece que "mediante promessa de compra e venda, em que se não pactuou arrependimento, celebrada por instrumento público ou particular, e registrada no Cartório de Registro de Imóveis, adquire o promitente comprador direito real à aquisição do imóvel".

Sendo assim, seria possível verificar que o contrato de compra e venda, mesmo em seu caráter promissário, seria lastreado pela obrigação de quitação do imposto em questão, uma vez que sua incidência é prevista em casos de transmissão de direitos reais sobre o imóvel, o que, segundo o Código Civil, ocorreria nos contratos de promessa.

Em consonância à Constituição Federal e fornecendo ainda subsídios adicionais à tese de que seria necessário que o promitente comprador arcasse com os custos do tributo, o Código Tributário, em seu inciso II do artigo 35, prevê que o ITBI possui como um de seus fatos geradores "a transmissão, a qualquer título, de direitos reais sobre imóveis, exceto os direitos reais de garantia".

Não obstante a isso, importante estar atento à particularidade dessa hipótese, no sentido de que, de acordo com a legislação, o contrato de promessa de compra e venda só atrairia a incidência do tributo quando houvesse a presença de dois requisitos cumulativos: 1) inexistência de cláusula de arrependimento; e 2) registro no cartório de registro de imóveis.

Essa especificidade se deve ao fato de que a existência da possibilidade de arrependimento geraria insegurança jurídica ao promitente que arcaria com o pagamento imposto, dado que o vendedor do imóvel poderia retirá-lo do mercado após o pagamento do ITBI.

No mesmo sentido de garantir a seguridade jurídica ao promitente comprador, que arcaria com o ônus de pagamento do imposto, o contrato de promessa deveria gozar de fé pública, o que ocorreria mediante seu registro no cartório competente.

Entretanto, contrapondo a teoria desenvolvida ao longo deste artigo e corroborando o posicionamento dos demais juristas, o entendimento jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça aponta para a não incidência do ITBI sobre promessa de compra e venda.

Para os tribunais superiores, é indevida a cobrança de ITBI realizada ao promitente comprador, quando realizada em momento anterior ao registro do título de efetiva transferência da propriedade.

Em verdade, no último dia 12 o Supremo Tribunal Federal reafirmou esse entendimento, definindo que, sob a luz da garantia da segurança jurídica, não incide ITBI sobre a promessa de compra e venda. O assunto, que consta no ARE 1294969, firmou-se como tema de repercussão geral da corte sob o número 1124, nos termos seguintes: "Incidência do Imposto de Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) na cessão de direitos de compra e venda, ausente a transferência de propriedade pelo registro imobiliário".

Ainda, nos termos do voto do atual ministro presidente do Supremo Tribunal Federal, Luiz Fux, "o fato gerador do Imposto sobre Transmissão Inter Vivos de Bens Imóveis (ITBI) somente ocorre com a efetiva transferência da propriedade imobiliária, que se dá mediante registro".

Portanto, conclui-se que, apesar do posicionamento divergente entre juristas, o entendimento dos tribunais superiores é de que não incide ITBI sobre a promessa de compra e venda, pois, no momento da celebração do contrato preliminar de compra e venda, não houve a efetiva transferência da propriedade.

Alberto Malta é sócio-fundador do escritório Malta Advogados, professor de Direito Imobiliário da Universidade de Brasília (UnB), presidente da Comissão de Direito Imobiliário da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional do Distrito Federal, mestre em Direito, Estado e Constituição com ênfase em Direito Imobiliário Registral pela UnB, pós-graduado do programa de Master in Business Administration em Gestão de Negócios de Incorporação Imobiliária e Construção Civil pela Fundação Getulio Vargas (MBA/FGV), pós-graduado em Direito Imobiliário pelo Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP) e árbitro da Câmara Brasileira de Arbitragem na Administração Pública (Cambraap).
Ana Carolina da Motta Mattos é estagiária no escritório Malta Advogados, bacharelando em Direito pela Universidade de Brasília, membro do núcleo de Promotoras Legais Populares e membro do Voluntariado Ajuda Legal.
Fonte: Revista Consultor Jurídico

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